Muito obrigado.
É um tema que me interessa bastante e gostava de o ver discutido.
Vou colocando artigos, em que participei, sobre o tema.
COMPRAS PÚBLICAS DEVEM SER FEITAS
A PENSAR NA INDÚSTRIA NACIONAL
3 de Abril de 2006
A definição de uma política de aquisição de equipamentos de defesa é um processo complexo em que se torna necessário recorrer a uma análise de custo-benefício de formas alternativas de realizar a aquisição: desenvolver e comprar equipamento nacional, comprar disponível no mercado, com ou sem compensações econó micas, ou ainda participar em projectos cooperativos para desenvolvimento de sistemas internacionais como, por exemplo, o avião de transporte estratégico A400M, da Airbus Military, que será construído em Sevilha.
Com o fim da I Guerra Mundial, a política de aquisição da maioria dos países europeus passou a estar associada à produção, sob licença, de armamento, na sua maioria norte-americano, como é o caso da produção na Europa dos caças F-16. Foi o primeiro passo para uma relação entre a economia e a defesa mais complexa e lucrativa: a cooperação internacional para desenvolver e produzir equipamento, com diversas vantagens.
Do ponto de vista económico, para além de desenvolver a base industrial nacional, permite a partilha de custos e riscos, obtém sinergias para realização de Investigação & Desenvolvimento (I&D) e cria economias de escala. Do ponto de vista militar, proporciona o desenvolvimento de soluções adaptadas às necessidades reais das Forças Armadas dos estados que participam no projecto, minimiza duplicações e facilita a integração e a normalização dos sistemas, aumentando a interoperabilidade entre aliados, um dos objectivos que a União Europeia procura concretizar.
Em Portugal, a política de aquisição de equipamentos militares não tem contemplado a perspectiva industrial, concretizando-se na aquisição de equipamentos disponíveis no mercado, com um pacote de contrapartidas associado, de valor igual ou superior ao da aquisição. No entanto, em Portugal, e de acordo com o Departamento de Comércio dos Estados Unidos, a eficácia deste instrumento ficou bastante aquém do esperado, contrastando com outros países, como os países Airbus (Alemanha, Espanha, França e Reino Unido) ou a Finlândia, um caso de referência neste domínio (ver gráfico).
O papel das contrapartidas
Integrar a perspectiva económico-industrial na política nacional de aquisições militares torna-se, assim, uma importante decisão político-estratégica que terá de passar pela identificação da Defesa como uma área estratégica para o desenvolvimento da indústria nacional, justificada pelo elevado valor acrescentado dos produtos e serviços que adquire, baseados em tecnologias inovadoras com potencial de duplo uso e aplicação em diversos sectores.
As contrapartidas têm, nesta fase e neste processo, um papel determinante, por um lado, possibilitando a capacitação da indústria nacional, através de programas de transferência de tecnologia ou equipamento, formação ou certificação, e, por outro, facilitando o seu acesso ao mercado e a entrada em programas considerados estratégicos para Portugal.
Neste sentido, devem ser privilegiadas as contrapartidas directas, realizadas no sistema adquirido, orientadas para actividades de elevado valor acrescentado que criem a capacidade de costumizar, manter e melhorar os sistemas adquiridos e preparem a indústria nacional para aceder a programas internacionais em desenvolvimento.
Desta forma, são abertas as portas para induzir uma lógica de participação industrial (ver caixa) associada às aquisições militares nacionais, que será crítica para a sustentabilidade da base tecnológica e industrial nacional para a Defesa e toma uma importância cada vez maior, face à pressão europeia para impor procedimentos comerciais às aquisições militares, inviabilizando, por exemplo, mecanismos como as contrapartidas.
A política de aquisição nacional deve considerar para cada sistema a adquirir, para além de características como desempenho, custo total ou tempo de entrega, o potencial impacte para a economia e interesse estratégico do envolvimento da indústria no sistema, para, assim, identificar os sistemas em cujo desenvolvimento Portugal deverá participar e aqueles que serão adquiridos no mercado com um pacote de contrapartidas associado.
Pensar a médio
e longo prazos
O envolvimento nacional nestes programas passa pelo planeamento de aquisições militares a médio e longo prazos, definidas pelas necessidades das Forças Armadas nacionais e europeias e pelos compromissos assumidos internacionalmente, que são consubstanciadas na Lei de Programação Militar, identificando, a partir daí, com a indústria, as áreas tecnológicas que serão determinantes para o futuro da indústria e da Defesa nacional, nas quais Portugal deve investir para criar e consolidar competências distintivas, para se posicionar num nível internacional de excelência.
As áreas tecnológicas que se apresentam como as mais interessantes para serem alvo do investimento nacional são as transversais, com um
elevado potencial de aplicação a outros sectores, como é o caso do C4ISTAR – Comando, Controlo, Comunicações, Recolha de Informação, Vi gilância, Aquisição de Alvos e Reconhecimento por Computador. A visão estratégica do C4ISTAR passa por criar capacidades que permitam
às Forças Armadas gerar, usar e partilhar a informação necessária à sua sobrevivência e sucesso em cada missão. Estes sistemas são
a base da inovação militar e a maioria dos países europeus identifica-os como investimentos prioritários. No caso de Portugal, a liderança do grupo de projecto europeu responsável pela reorganização e reequipamento das Forças de Operações Especiais (FOE) constitui uma oportunidade para desenvolver alguns destes sistemas (ver caixa).
Assim, na definição de uma política de aquisição de equipamento de defesa abrangente, que considere o benefício do país de uma forma integrada e potencie a evolução do envolvimento de empresas portuguesas nas contrapartidas directas e nos contratos de participação industrial, é fundamental alargar e reforçar o âmbito de intervenção da Comissão Permanente de Contrapartidas, potenciando, eventualmente, sinergias com a área das grandes compras civis, à semelhança do ISDEFE espanhol, e estabelecendo pontes com outros organismos responsáveis pela política de empresa, de ciência e tecnologia e inovação.
POR ANA MAGALHÃES E FRANCISCO VILHENA DA CUNHA